27 de outubro de 2008

Oswaldo e as linhas

Oswaldo sempre preferiu linhas a pontos. Ou melhor, nunca viu um ponto na vida. Quando de pontos se tratava, a linhas sempre recorria.

Nos seus passeios, nunca lembrava do que via, só do que tivesse uma história, ou só do que tivesse um caminho pronto. Algo que fizesse sentido. E nunca fez sentido a contemplação pura, pois nunca houve um ponto, só pontos. Como na matemática, num gráfico, onde um ponto é invisível, uma abstração; ele só via linhas. Só ligava pontos.


Não que se tratasse só de retas, muito pelo contrário. Eram mais curvas do que qualquer outra coisa, curvas que se cruzavam - embora na maioria das vezes voltassem pro mesmo lugar.
Mas sempre houve infinitos pontos ao redor dessas retas, mas pontos esses que Oswaldo nunca teve a oportunidade de ver. Aliás, a idéia de infinito era pra ele pior do que qualquer outra, nada o atormentava mais.

Nas aulas de matemática no segundo grau e nos primeiros períodos da faculdade de engenharia sentia dor de cabeça só de falarem em infinito. Mas depois passaram, ele associou o infinito à um símbolo e criou uma história pro símbolo; o resto decorou.
Porque o problema com infinito vinha desde muito tempo, ele já havia desistido.

Talvez, a primeira manifestação tenha sido numa visita ao Planetário, na terceira série, onde, na sessão de perguntas abertas aos alunos no final da apresentação, perguntou a um astrônomo como era o infinito; o cientista o ignorou e respondeu à pergunta do amigo do lado. Ele nunca se recuperou.


Porém, antes que voe a primeira garrafa no autor do conto, há de se dizer: o infinito talvez seja uma das idéias mais difíceis que existam sim, ou talvez a idéia mais difícil. Idéia essa que já fascinou tantos autores, de Borges à Nietzsche.

E, talvez, conseguir enxergar um ponto seja o oposto dessa idéia, mas tão difícil quanto imaginar o infinito. Por isso se constroem os aceleradores de partícula, tentar ver o nunca visto; fazer a ciência evoluir.
Ciência essa que não usa um método muito diferente do Oswaldo. São sempre histórias. Um átomo, por exemplo, com todos seus elétrons, nunca foi visto. Mas é uma história bem convicente. Ou a física. São histórias que fazem sentido; teorias e hipóteses.

Por isso, Oswaldo sempre foi um homem da ciência, e nunca da fé. Por isso nunca viu mais do que linhas.

4 comentários:

Unknown disse...

Tenho a impressão que você melhora a cada dia ^^

Ricardo Goulart disse...

o cientista o ignorou e respondeu à pergunta do amigo do lado. Ele nunca se recuperou

aaah coitado.

Tia Duna disse...

Eu estava por aí, googlando, procurando uma imagem da carta de tarô da morte para colocar no meu blog (em um post nada místico sobre mudanças da vida para justificar minha ausência de meses), quando encontrei este blog, li o post do Ric feito em maio de 2007 e, meu, adorei. Daí pensei, se já era assim a um ano e meio atrás, agora deve estar melhor. Não me enganei, Luis. Você também é ótimo.
Vou fuçar este blog até não sobrar um.
Beijos,

Luis disse...

Obrigado, que bom que gostou e comentou =)
E o Ricardo ainda tem um blog(ao menos teoricamente, pois não posta há seculos). É o http://plataodeciroulas.blogspot.com/

bjs